O cuspe ou a palavra

Políticos.

O cuspe ou a palavra

A escola ligou. Seu filho cuspiu no colega. Motivo: o colega vem agredindo verbalmente o seu menino e, dado momento, ele não se segurou. Cuspiu. A outra família também recebe a mesma ligação. E agora: o que fazer? Como agir? A escola precisa tomar uma atitude. Suspensão? Expulsão? Flexão? Pra quem?

Agora, voltemos para nossa realidade – ainda mais cruel do que o que se nota nos corredores dos colégios. Dever ser porque viramos adultos e não nos corrigiram quando ainda eramos moleques. Tempos depois, o cenário muda, a plateia muda, evoluímos nossas ideologias e acumulamos nossos dramas.

No ringue político, Jair Bolsonaro versus Jean Wyllys usam armas como palavras, discursos, cartazes ofensivos, ameaças, cusparada. E, no meio disso tudo, nos colocamos como juízes de Facebook e discutimos a forma de agressão que é válida. Que tipo de violência legitimamos e aceitamos? Fazemos caça às bruxas, e checamos quantos amigos seguem Bolsonaro; postamos vídeos de promessas ditas e não cumpridas de Jean. Investigamos os ângulos do cuspe, o teor das palavras, a ordenação dos fatos. Divulgamos vídeos com farsas montadas e textos que defendem aquele que nos representa de alguma forma. Brigamos com amigos, criamos desafetos.

Entre cusparadas e ofensas digitais, me vejo a fazer uma reflexão – não uma defesa. Uma reflexão de quem não votou em Jean Wyllys. Uma reflexão de quem não votou em Jair Bolsonaro. O episódio, digno de pedir para tirar as criancinhas da sala, também traz uma oportunidade de pensarmos sobre as tantas agressões ditas ou veladas no dia dia dirigidas às minorias.

O deputado Jair Bolsonaro, e novamente não me importa sua posição partidária, vem constantemente de forma pública agredindo pessoas. E, principalmente, as minorias. Ora os homossexuais; ora os índios; ora as mulheres. Ele tem posicionamentos bastante claros e uma fala de intolerância: é a favor da ditadura e apoia extermínios de quem não segue a sua mesma linha moral.

É isto o que queremos? São políticos assim, que não respeitam outros seres humanos? Com este tipo de conduta? É isso que queremos ensinar aos nossos filhos? Mas Bolsonaro representa alguém. Muitos alguens, já que foi o deputado mais votado do Rio. Então, não se espante de ter amigos que o seguem no Facebook. Seus votos saíram de algum lugar. Saíram do meio de nós.

A cusparada de Jean – seguida pela cusparada de Eduardo Bolsonaro – foi um momento de catarse. Representa uma reação à postura de seu opositor, que visa a eliminar as diferenças.  Explica, mas não justifica. O tempo da escola em que os pais vinham conversar com a direção ficou pra trás. O mundo adulto exige – ao menos deveria – que tenhamos mais controle de nossas reações e, sim, mais respeito.

Respeito deveria ser a palavra de ordem. Deveríamos dizer “respeito” acordar e, em seguida, proferir livremente “respeito” ao porteiro, às crianças, aos colegas de trabalho, aos amigos de Facebook. Respeito. Precisamos de mais respeito a todos, a maiorias e minorias, a todos.

Talvez se entendermos que um dia – ou em alguma situação – podemos ser a minoria, possamos olhar para elas de forma diferente. Podemos fazer parte de uma maioria que pede que alunos com deficiência nas escolas tenham os mesmos direitos que todos os demais alunos. Mas esses mesmos alunos podem ser a minoria quando estão lá dentro.

Se os dois fossem meus filhos, teriam de pedir desculpas e sentar para conversar de forma respeitosa. Até por que, maioria ou minoria, vocês dois têm, ao menos, uma coisa em comum: a letra jota no nome. Já dá pra sentar para conversar…

Ciça Melo
cica.melo@paratodos.net.br


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