É pra ontem!

Cartaz de divulgação Netflix do documentário “AmarElo"

É pra ontem!

Neste fim de semana, consegui assistir ao documentário “AmarElo: é tudo pra ontem” sobre o Emicida. Simplesmente arrebatador! O filme, produzido pela Netflix, narra os bastidores do show realizado no Theatro Municipal de São Paulo, mostrando a história do rapper e seu processo de criação da obra-prima, que é “AmarElo”. O título tem inspiração no poema do Paulo Leminski (“Amar é um elo | entre o azul | e o amarelo”). Para o cantor, amar é a forma mais revolucionária de conectar as pessoas. Tem toda razão!

E, por que escolhi escrever sobre este tema no último texto do ano? Ah, porque como canta Belchior, resgatado pelo rapper, “tenho chorado demais, tenho chorado pra cachorro”. Na letra da música “Tudo é pra ontem”, Emicida sugere que “talvez seja bom partir do final. Afinal, é um ano todo só de sexta-feira treze”. Se pudesse colar uma figurinha de meme agora, sem dúvida, lançaria esta: “é verdade; quer dizer, também não é”.

2020 foi difícil – é impossível negar, mas foi um ano, também, de muita aprendizagem e encontros. Estive, junto com um grupo de estudiosas sobre a Abordagem Pikler no Equador, em fevereiro, para um curso na Fundação Ami. Lá, consegui ampliar ainda mais o olhar sobre a potência da criança com deficiência. Tive acesso a vídeos, retratando o cotidiano de algumas delas e pude ver como podem chegar longe se lhes dão oportunidade e se gozam da confiança de um adulto. O encantamento pela Fundação Ami foi tanto que eu e Gabriela Dal Forno Martins quisemos repartir a experiência com mais gente. O zoom nos permitiu trazê-los pro Brasil!

Foi graças à tecnologia que pude também encontrar, diversas vezes durante o ano, o psicanalista francês Bernard Golse que deu maravilhosas palestras sobre desenvolvimento infantil e constituição psíquica do sujeito. Golse é também um dos grandes especialistas sobre autismo. Foi um luxo! Ainda tivemos a pediatra Isabelle Deligne, virtualmente, falando sobre crianças com desenvolvimento lento ou diferente. Estive, duas vezes, com Ute StruB e Elsa Chaim, uma na Alemanha e outra nos EUA, experimentando o brincar, atividade tão cara às crianças e tão pouco valorizada por muitos adultos. Da Alemanha ainda encontrei Alê Duarte, com o seu Sintonizando Com Pais e, depois, Com Família. Além de mais um semestre na especialização sobre Terapia de Família e Casal na PUC-Rio. Nunca estudei tanto durante um ano!

Estive também do outro lado das telas, dando aulas no curso de graduação em Psicologia na PUC-Rio e na especialização em Infância e Juventude, promovida pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Em termos de empresas, eu e minha querida companheira de Paratodos, Ciça Melo, estivemos juntas na Parceiros da Educação. Ciça conversou também com a equipe da L’Oréal sobre a inclusão da pessoa com deficiência no mundo corporativo. Durante o ano, partilhamos experiências e telas em lives e formações.

Por falar em lives, Ciça brilhou em várias! Ela tem a incrível capacidade de falar com o público como se todos estivéssemos juntos (de verdade) no seu sofá. A gente se sente à vontade e quer saber mais. Ela vai tão longe com a sua capacidade de se conectar com as pessoas, que atravessou o mar e deu aula para os alunos de mestrado do Instituto Politécnico de Setúbal (Portugal). Aliás, este ano o Paratodos não esteve na “terrinha” com o Vindas, mas Ciça esteve diversas vezes com o casal Luzia e David Rodrigues em suas “Conversas Confinadas”. De lá, eles nos deram notícias sobre como o país estava lidando com os alunos com deficiência.

A gente também não poderia deixar de lembrar uma batalha vencida: o Decreto 10.502/20, que reinstituía o foco na segregação em escolas especiais das crianças com deficiência, foi declarado inconstitucional pelo STF. Foi uma vitória, mas … pudemos perceber que a inclusão, de fato, das pessoas com deficiência não é algo que está solidificado. Estamos caminhando, porque durante muito tempo elas eram “invisíveis”.

Termino, então, com Emicida: “É tão triste ter que vir, coisa ruim pra nos unir | E nem assim agora, mano, vamo’ embora a tempo | Viver é partir, voltar e repartir (é isso) | Partir, voltar e repartir (é tudo pra ontem)”.

Que 2021 seja um ano de viver em comunhão, deixar partir o preconceito, voltar a nos encontrar pessoalmente, repartir a vacina e incluir os nossos irmãos invisibilizados. É tudo pra ontem! Tá ligado, mano?

 


© Netflix / reprodução

Flavia Parente
flavia.parente@paratodos.net.br


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