De especial, nada

De especial, nada

O que uma pessoa com deficiência tem de tão especial? Nada. Nadica. Niente. É apenas uma pessoa que tem deficiência que traz também outras inúmeras características físicas e emocionais. Mas a nossa sociedade cisma em marcar a deficiência como a única ou a maior marca do indivíduo com deficiência. E, para colocar todo mundo no mesmo bolo, o termo especial se consagra para se referir desde a crianças com autismo até adultos com cegueira. São todos especiais. É a escola que chama o aluno em situação de inclusão de aluno especial. É a empresa que cria cargos para colaboradores especiais. É o político que promete ações para os especiais. É o médico que adianta que a criança terá necessidades especiais ao longo da vida. É a mãe que, ao se referir ao filho com alguma síndrome, diz que tem um filho especial. Nesses momentos, eu só penso no outro – no outro aluno, no outro colaborador, no outro eleitor, no outro paciente, no outro filho – que deve sentir abalada a autoestima e se perguntar: “e eu?”.
Por vezes, me pergunto se esse termo – especial – já não deve ter fez estragos por aí. Afinal, quem não quer ser especial? O problema é que a ingênua palavrinha acaba levando a outros equívocos. Como achar que adaptação de prova ou mais tempo para fazer uma atividade na escola são privilégios – e não direito. Ou ter assentos especiais em teatros ou trens é vantagem – e não direito. Ou ter prioridade na fila do supermercado é benefício – e não direito. Ou achar que a família foi abençoada por ter um ser tão especial, um anjo, em casa. Então, quem fica de fora pode ficar meio ressentido – com inveja mesmo. Não à toa tem gente que se disfarça de cadeirante em grandes eventos para ter acesso ao que considera bons lugares. Na esfera familiar, ser especial já levou irmão, em busca de mais atenção, compreensão e afeto, a ter inveja da deficiência do outro. E por aí vai….
Ser especial nos leva à área VIP da cidade, das relações, da vida, e isso causa sentimentos antagônicos ao redor. Porém, contudo, todavia, ter necessidades específicas – e não especiais – nos leva à seara de direitos. Aí, é onde queremos chegar. Não é privilégio algum um aluno poder sair de sala para se organizar melhor internamente. Assim como não é privilégio  garantia de vagas exclusivas em ruas e shoppings. Zero privilégio os descontos na compra de carro ou nas passagens aéreas para pessoas com deficiência. Isso se chama direito. Deixa de ser direito quando encaramos as pessoas como especiais.
Está na hora de esse termo cair em desuso. Da mesma forma de “portador”. Não dá mais. Leis e direitos não podem ser feitos a partir de categorias de pessoas, mais ou menos especiais. Porque ou somos todos especiais ou ninguém é.
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Se ainda assim, você não se convenceu de que “especial” não é o termo correto a se usar,  assista ao vídeo abaixo, estrelado pela atriz Lauren Potter.


Fabiana Ribeiro
fabiana.ribeiro@paratodos.net.br


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